Auschwitz


Auschwitz. Estava escrito na capa do filme. Ela sabia bem do que se tratava, afinal, havia trabalhado, e muito, com o assunto durante a faculdade. Mas diante da pergunta de um homem tão inacreditavelmente próximo e inconcebível, às vezes ela não sabia o que dizer, como agir, nem reconhecer o mundo, até então, totalmente legendado.

Pelo mesmo motivo, também naquela noite, havia derramado a comida na mesa do restaurante; deixado o salto enganchar numa das imperfeições do piso; ficado com as mãos geladas e a mente zonza. Ele era íntimo. Muito. Ele era mistério. Também.

Aquele homem que olhava em seus olhos e decifrava a lucidez e as insanidades da sua alma. Aquele homem que sabia a hora e a forma de tocá-la, passando por cima de uma pretendida vontade de estar serena, quieta. Aquele homem que quase sempre dispunha da palavra ideal. Era o homem que provocava nela um sentimento forte e engangorrado de fascínio e pavor.

Uma incógnita. Uma antítese. Ele parecia representar tudo o que ela gostaria de somar em um homem. E, ainda, era alguém de quem deveria escapar: um pouco por causa dele, que sabia cercar, e que pela forma apaixonada tornava-se irresistível e perigoso. E muito, e principalmente, pela incerteza de uma história a dois.

Se pensava em casa, sozinha, a decisão estava tomada. Desligar-se. Se estava ao lado dele, esquecia o significado de decisão. O vigor, o calor e a inteligência daquele homem arrebatavam seus sentimentos e sentidos. O comportamento, outrora alinhado ao controle dos impulsos, inexistia.

Auschwitz. Ela deveria ter escolhido assistir ao filme. Tema de tamanho interesse, e nada excitante para as coisas do amor, talvez tivesse impedido que mais uma vez caísse nos braços exatos daquele homem. Um momento de paixão. Uma vida de doces tormentos.



Ingrid Dragone

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